Toxinfecções alimentares colectivas

Apesar de muitos microorganismos poderem causar toxinfecções alimentares colectivas, sem dúvida que os mais comuns são: Clostridium perfringens, Staphylococcus aureus, Salmonella spp. (Quadro 1).

Alguns virus, embora estejam frequentemente associados a gastroenterite, raramente são causa de toxinfecções colectivas, excepto os vírus do grupo Norwalk.

A verdadeira intoxicação é, por definição, causado por toxinas produzidas por determinadas bactérias (ex: Clostridium perfringens, Staphylococcus aureus). Bactérias como a Salmonella spp. e a Shigella spp. não produzem toxinas mas ao invadirem o intestino resultam num síndrome similar, embora com uma diferença clínica importante: a febre, não característica das bactérias toxigénicas.

Geralmente as intoxicações alimentares são provocados por manutenção dos alimentos várias horas à temperatura ambiente (entre 10 e 60 ºC). Se antes da ingestão o alimento for aquecido a temperaturas superiores e durante 15 mn, são destruídas a maioria das bactérias e toxinas, excepto a toxina do Staphylococcus aureus, que é termo-resistente.

Perante uma intoxicação alimentar colectiva, o clínico deverá idealmente:

Fazer o diagnóstico de presunção, de forma a orientar o laboratório na escolha dos meios de cultura. Para este diagnóstico bastará ter em mente as três principais causas, segundo o Quadro 1.

Solicitar coproculturas a alguns dos afectados pela intoxicação (se houver apenas vómito, o que é comum no caso do Staphylococcus, pode ser necessário cultura do vómito).

Solicitar a comparência da Autoridade de Saúde.

No Quadro 2 descrevem-se algumas causas de intoxicação alimentar colectiva mais raras.

 

Quadro 1.  Caracterização das três causas mais frequentes de toxinfecção alimentar colectiva

bactéria

período de incubação (horas)

febre

vómito

diarreia

duração da doença (dias)

alimentos mais implicados

Clostridium perfringens (toxina)

+12

(6-24)

-

-

+

1-2

Grandes peças de carne mal cozinhada

Staphylococcus aureus (toxina)

+3

(1-6)

-

+

+

2

Carne pré-cozinhada, cremes, maionese.

Salmonella spp.

+24

(6-72)

+

+

+

2-5

(até 14)

Ovos, maionese, pastelaria, carne ave mal passada

 

Quadro 2.  Caracterização de algumas causas menos frequentes de toxinfecção alimentar colectiva

bactéria

período de incubação (horas)

sintomas

período de duração da doença (dias)

alimentos mais implicados

Bacillus cereus *

(toxina termolábil - semelhante à intoxicação por Clostridium perfringens)

+10

(6-16)

Diarreia

cólicas

1-2

Não especificados

Bacillus cereus *

(toxina termoresistente - semelhante à intoxicação por Staphylococcus aureus)

+2

(1-6)

Vómitos

cólicas

1-2

Arroz requentado no momento, mas preparado horas antes da refeição

Clostridium botulinum (toxina)

+12

(12-96)

Ptose

diplopia

paralesia

vómitos e diarreia

3-7

(eventualmente meses)

Conservas caseiras, presuntos e enchidos de carne caseiros

Shigella spp.

+48

(24-168)

Diarreia (c/ sangue e pus)

febre

4-7

Charcutaria, cremes e molhos pré-preparados, marisco mal cozido

Escherichia coli (4 categorias, algumas produzem toxinas)

+18

(12-72)

Diarreia (c/ sangue e muco)

cólicas

febre

3-5

Carne e hambúrgueres mal cozidos

Vibrio parahaemolyticus (semelhante à infecção por Salmonella spp.)

+12

(4-96)

Diarreia

cólicas

febre

2-5

Marisco mal cozido

Campylobacter jejunii

+96 (4dias)

(72-120)

Diarreia

cólicas

febre

1-10

Carne mal cozida

* O Bacillus cereus pode produzir dois tipos de toxinas, uma termoresistente e outra termolábil, que correspondem a dois síndromes distintos.

 

Bibliografia

Baron, Ellen J.; Finegold, Sidney M. Bailey and Scott`s diagnostic microbiology. 8th ed. St.Louis: C.V. Mosby, 1990.

Benenson, Abram S., ed. Controlo das doenças transmissíveis no homem. 13ªed. Washington: Organização Pan-Americana da Saúde, 1983.

Ferreira, F.A. Gonçalves. Moderna saúde pública. 5ªed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1982.

Last, John M.; Wallace, Robert B., eds. Maxcy-Rosenau-Last public health and preventive medicine 13th ed. Connecticut: Appleton and Lange, 1992.

Petersdorf, Robert G.; Adams, Raymond D.; Braunwald, Eugene, eds Harrison`s principles of internal medicine. 10th ed.New York: McGraw-Hill Book, 1983.

 

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© António Paula Brito de Pina, 1998