Toxicodependências

Repressão e Consumo Entre Reclusos

Na Europa o cannabis é a droga mais apreendida, ficando a heroína geralmente em segundo lugar.

No entanto, em Portugal, a heroína é a droga mais apreendida e os montantes apreendidos tem vindo a crescer, ao contrário das restantes drogas que têm vindo a diminuir.

Infelizmente, o número de detenções por tráfico ou por posse de drogas em geral, tem vindo a aumentar desde 1990 no nosso País mais que os montantes apreendidos, o que significa que por cada apreensão, cada vez menos droga é apreendida como se pode verificar nas figuras seguintes.

Número de apreensões e quantidade de heroína (Kg) apreendida por ano em Portugal em 1990-98

 Número de apreensões e quantidade de cocaína (Kg) apreendida por ano em Portugal em 1990-98

Número de apreensões e quantidade de haxixe (Kg) apreendida por ano em Portugal em 1990-98

Fonte: Instituto da Droga e Toxicodependência - Sumários de informação estatística 1998

Isto significa que as autoridades policiais, despendem cada vez maior esforço por cada dose apreendida e têm aumentado a sua eficácia principalmente na detenção de traficantes cada vez menores.

A confirmar esta ideia temos que o número de presumíveis infractores detidos aumentou 22% em 1998, mas sobretudo devido ao aumento dos consumidores (de 57% do total de detidos em 1997 para 61% em 1998) com uma diminuição dos traficantes (de 22% do total de detidos em 1997 para 16% em 1998).

Tendo em conta a estimativa da população portuguesa em 1998, poderemos referir que foram detidos por presumível crime relacionado com a droga cerca de 1,1 por mil habitantes, dos quais 0,7 foi devido a consumo, 0,3 por tráfico-consumo e 0,2 por tráfico. Acrescenta-se que o Distrito de Faro é aquele que regista por habitante uma maior frequência de detenções no ano de 1998, tal como podemos visualizar na Figura 7.

No entanto, apesar de em Portugal se deterem muitos mais presumíveis consumidores que traficantes, a verdade é que os traficantes detidos são geralmente condenados a pena de prisão efectiva (68% em 1998), enquanto os consumidores são apenas condenados a multa efectiva (79%).

 Número de presumíveis infractores detidos por droga, por distrito e por 1000 habitantes, em 1998

Relativamente aos nossos reclusos, em 1997, cerca de 25% destes foram condenados por problemas associados à droga, embora quase todos devido a tráfico e apenas cerca de 2% devido a consumo ou tráfico-consumo. No ano seguinte, 37,7% dos reclusos foram condenados por droga, sendo 3% devido ao consumo ou tráfico-consumo.

No entanto, segundo estudo promovido nas prisões portuguesas, cerca de 70% de todos os reclusos consumiam, antes da entrada na prisão, uma substância psicoactiva, embora não tivessem sido condenados por isso.

Por outro lado, a Direcção-Geral de Serviços Prisionais estima que a prevalência de seropositividade para o HIV, bem como para a Hepatite B, seja entre 15 a 20%, e para a Hepatite C de 24,5%.

É curioso analisar a percentagem de heroína apreendida versus total (consumida mais apreendida). Em estudo efectuado pelo SPTT/Direcção Regional do Algarve, baseado nos dados das apreensões de heroína fornecidos pelo IPDT e as estimativas demográficas do INE, estimou-se a percentagem de heroína apreendida em oito cenários diferentes (quadro seguinte).

Estimativa do total de heroína consumida, percentagem de heroína apreendida sobre a heroína total (estimativa da consumida mais apreendida) e valor total de vendas de heroína consumida em Portugal, em 1998, segundo oito cenários diferentes

Cenários segundo a percentagem de população consumidora, pureza de heroína e consumo médio diário

Estimativas

Percentagem estimada de consumidores

Pureza da heroína consumida

Consumo médio diário por consumidor

Total de heroína consumida em Portugal

Percentagem de heroína apreendida e consumida

Valor total de vendas em (milhões de contos)

(A)

(B)

 (C)

*

**

***

0,5%

 5%

0,25 g

 227 kg

29,9

 50

0,50 g

 455 kg

17,6

100

10%

0,25 g

 455 kg

17,6

 50

0,50 g

 910 kg

 9,6

100

 0,75%

 5%

0,25 g

 341 kg

22,1

 75

0,50 g

 682 kg

12,4

150

10%

0,25 g

 682 kg

12,5

 75

0,50 g

1364 kg

 6,6

150

* (A) x (B) x (C) x 365 dias X 9.968.360 (estimativa da população portuguesa em 1998)

** Total heroína apreendida em 1998 (97 Kg) / (97 Kg + total heroína consumida)

*** (A) x (C) x 365 dias x 9.968.360 x 11 contos (partindo do pressuposto qie 1 grama vale 11.000$00).

Nota: cálculos baseados nos pressupostos referidos para cada cenário e em dados fornecidos pelo IPDT (heroína apreendida em 1998 = 97Kg) e estimativas demográficas do INE da população portuguesa em 1998 (9.968.360).

Estima-se que na União Europeia seja apreendida cerca de 10% do total de heroína. No entanto, Portugal é o único país deste grupo em que a heroína é a droga mais apreendida, suplantando o cannabis. O Quadro anterior revela que provavelmente em 1998 foi apreendida mais de 10% da heroína total no nosso País, e a quantidade de heroína consumida deverá ter sido superior a 500Kg, sendo o seu valor de vendas superior a 50 ou mesmo 100 milhões de contos por ano.

António Paula Brito de Pina © Portal de Saúde Pública, 2000