Gripe Pandémica Manual

Gripe das Aves

Sumário:

1. O que é a gripe das aves

Regiões com gripe das aves

Infecção humana com o vírus da gripe das aves

Transmissão e disseminação da gripe das aves

Sinais e sintomas da infecção humana com o vírus da gripe das aves

2. Como pode surgir uma pandemia originada pela gripe das aves

Situação actual

Causas possíveis de pandemia pelo vírus A(H5N1)

Transmissão inter-humana do vírus A(H5N1)

Dificuldade na erradicação da gripe em aves de capoeira

3. Como proteger a população

Vacinas

Fármacos antivíricos

Características da gripe pandémica

1.  O que é a gripe das aves

A gripe das aves, ou “gripe dos pássaros”, é uma doença contagiosa dos pássaros causada pelo vírus influenza A. Pensa-se que todas as espécies de pássaros são susceptíveis à infecção com aquele vírus, mas as aves domésticas são especialmente vulneráveis. Nestas, os vírus da gripe podem originar grandes epidemias (epizootias) com elevada morbilidade e mortalidade. Existem diferentes vírus da gripe das aves, sendo uns mais graves que outros. Nas aves, o vírus A(H5N1) tem uma elevada patogenicidade, é muito contagioso e a taxa de mortalidade é de cerca de 100% a morte pode ocorrer no mesmo dia de aparecimento dos primeiros sinais/sintomas.

Regiões com gripe das aves

A gripe das aves ocorre em todo o mundo. A actual panzootia do vírus A(H5N1) teve início em Dezembro de 2003, na Coreia do Sul, e já atingiu muitos países em vários continentes [1]. Em diversos países, sobretudo da Ásia, também houve pessoas infectadas com aquela estirpe do vírus da gripe das aves.

No portal da Organização Mundial de Saúde Animal www.oie.int pode consultar-se a lista actualizada de países com infecções em animais. Os portais seguintes disponibilizam informação actualizada e detalhada sobre a gripe das aves:

Infecção humana com o vírus da gripe das aves

Os vírus da gripe das aves raramente infectam outras espécies animais, além de pássaros e porcos. No contexto histórico, as infecções humanas com os diferentes vírus da gripe das aves são raras e geralmente originam quadros clínicos pouco graves (doença moderada). Os primeiros casos documentados de infecção humana pelo vírus influenza A(H5N1) ocorreram durante um surto em Hong Kong, na Primavera de 1997. Entre Maio de 1997 e Março de 1998 foram diagnosticados 18 casos de infecção, complicados com doença respiratória grave, 6 dos quais foram fatais (letalidade: 33%). A investigação então efectuada revelou que a fonte da infecção das pessoas tinha sido o contacto com aves de capoeira infectadas (galinhas, patos e gansos). O mesmo vírus reapareceu em Hong Kong, em Fevereiro de 2003, tendo infectado duas pessoas (com um óbito). A epidemia actual de A(H5N1) teve início em Dezembro de 2003, e até 30 de Dezembro de 2005 foram confirmados 142 casos de infecção humana, com 74 mortes (letalidade: 52%).

Recentemente também ocorreram infecções humanas causadas pelos vírus A(H7N7) e A(H9N2), embora menos graves que os casos de infecção com o A(H5N1). Na Holanda, em 2003 registaram-se 83 casos de infecção com o vírus A(H7N7), com um óbito (médico veterinário). Em Hong Kong o vírus A(H9N2) infectou duas crianças em 1999 (doença ligeira) e uma em Dezembro de 2003.

Casos Confirmados de Infecção Humana com os Virus da Gripe das Aves em 1997-2005

Ano

Estirpe

País

Casos

Óbitos

1997

A(H5N1)

Hong Kong

 18

 6

1999

A(H9N2)

Hong Kong

  2

 0

2003

A(H5N1)

Hong Kong

  2

 1

2003

A(H7N7)

Holanda

 84

 1

2003

A(H9N2)

Hong Kong

  1

 0

2003-2005*

A(H5N1)

Camboja, China, Indonésia, Tailândia e Vietname

142

74

* Casos confirmados e notificados à Organização Mundial de Saúde entre 26-12-2003 e 30-12-2005

Em Portugal ainda não houve casos de infecção humana associados à actual epizootia de A(H5N1), embora a sua ocorrência em aves e pessoas seja uma possibilidade remota. Na sua forma actual, o vírus A(H5N1) pode ser introduzido em Portugal pelas aves migratórias aquáticas, pela importação ilegal de pássaros portadores do vírus, ou através da importação da carne de galináceos contaminados. A sua introdução no país também pode ocorrer através de viajantes infectados. Considerando a rapidez e a frequência das viagens por todo o mundo, o risco de uma gripe pandémica atingir Portugal, após o seu aparecimento em outros países, é muito elevado.

Transmissão e disseminação da gripe das aves

Entre os animais de capoeira a transmissão dos vírus da gripe das aves pode ocorrer através das secreções respiratórias ou do contacto com fezes contaminadas. Um grama de fezes contaminadas pode ter uma carga vírica suficiente para infectar cerca de um milhão de pássaros. As excreções dos animais infectados também podem contaminar solos, poeiras, água, alimentos, equipamentos, vestuário, etc.

Geralmente as pessoas infectam-se através do contacto com pássaros infectados ou com as suas fezes. Até ao momento não existe evidência conclusiva sobre a possibilidade de transmissão inter-humana do vírus A(H5N1).

Sinais e sintomas da infecção humana com o vírus da gripe das aves

Em humanos o quadro clínico resultante da infecção com o vírus da gripe das aves pode ser idêntico ao da gripe comum, com ou sem conjuntivite, mas com um elevado potencial de evolução para um quadro clínico grave com pneumonia, depressão respiratória severa ou outras complicações graves e mortais. Relativamente à evolução clínica dos casos humanos de infecção com o vírus da gripe das aves A(H5N1), a informação publicada limita-se aos casos estudados do surto de Hong Kong, em 1997-1998 [2]. O quadro clínico dos doentes incluía febre, faringite, tosse e, em alguns dos casos fatais, depressão respiratória grave devida a pneumonia vírica.

1 3

2.  Como pode surgir uma pandemia originada pela gripe das aves

Os peritos da Organização Mundial de Saúde receiam que o aparecimento e disseminação do vírus A(H5N1) em muitos países do continente asiático seja o prenuncio da próxima pandemia de gripe.

Situação actual [3]

A epidemia actual, devida ao vírus altamente patogénico A(H5N1) sem precedentes em termos de dimensão e rapidez de disseminação tem aumentado o receio da ocorrência de uma nova pandemia de gripe. Desde o seu aparecimento na Coreia do Sul, em Dezembro de 2003, aquela estirpe do vírus influenza já infectou aves de capoeira em vários países asiáticos Camboja, China, Indonésia, Japão, Malásia, Mongólia, República da Coreia, Republica Democrática do Laos, Tailândia e Vietname. Desde Julho de 2005 já ocorreram casos de infecção em aves domésticas e selvagens na Europa e em África. Em diversos países já se registaram vários casos de infecção humana com a estirpe A(H5N1), sendo a letalidade superior a 50% (ou seja, morrem mais de metade dos casos de doença).

Apesar da estirpe A(H5N1) não ser desconhecida – 18 casos de infecção humana, com 6 mortes, durante o surto de Hong Kong em 1997-1998 – representa uma enorme ameaça mundial em termos de saúde pública, pelos surtos que já originou em diversos países e pela dificuldade no seu controlo.

A infecção humana com o vírus da gripe das aves é relativamente rara e, de acordo com a evidência científica actual, ocorre geralmente através do contacto com aves de capoeira infectadas. Apesar das infecções humanas conhecidas terem ocorrido sobretudo em cinco países asiáticos, é possível que também ocorram em países de outros continentes.

Número acumulado de casos humanos de infecção com o virus A(h5n1). Casos declarados à OMS em 2003-2005

 

camboja

china

indonésia

tailândia

Vietname

total

casos

óbitos

casos

óbitos

casos

óbitos

casos

óbitos

casos

óbitos

casos

óbitos

2003

--

--

--

--

--

--

--

--

 3

 3

  3

 3

2004

--

--

--

--

--

--

17

12

29

20

 46

32

2005

4

4

7

3

16

11

 5

 2

61

19

 93

39

Total

4

4

7

3

16

11

22

14

93

42

142

74

Fonte: WHO. Confirmed human cases of avian influenza A(H5N1), http://www.who.int/csr/disease/avian_influenza/country/cases_table_2005_12_30/en

O portal da Organização Mundial de Saúde www.who.int/csr/en disponibiliza informação actualizada sobre o total de casos de infecção humana com o vírus influenza A(H5N1).

Causas possíveis de pandemia pelo vírus a(h5n1)

O vírus A(H5N1) pode originar a próxima pandemia de gripe devido à sua capacidade de infectar pessoas e de causar doença grave, e à possibilidade de mutação e de integração de genes provenientes de virus habituais em outras espécies animais. O vírus pandémico pode surgir por mutação de um vírus da gripe das aves ou por troca de material genético (recombinação) entre um vírus da gripe das aves e um vírus da gripe humana. Esta situação pode ocorrer no próprio homem ou noutra espécie de mamíferos (porco, cavalo, etc.), se forem infectados simultaneamente pelos dois vírus. Contudo, a ocorrência de mutações e recombinações é muito difícil de prever.

A estirpe H5N1 é altamente patogénica, e existem provas de que tem capacidade para transpor a barreira das espécies e causar doença grave, com elevada letalidade em humanos, e que a sua disseminação continuada entre as aves também aumenta a possibilidade da infecção também ocorrer em pessoas.

Os especialistas de saúde pública sabem que os vírus da gripe das aves e dos seres humanos podem combinar genes entre si, quando uma pessoa é simultaneamente infectada com vírus de ambas as espécies. Esta troca de genes no organismo humano pode originar um novo subtipo de vírus, para o qual muito poucas ou nenhumas pessoas terão imunidade natural. Se o novo vírus tiver genes humanos em quantidade suficiente, pode ocorrer a transmissão de pessoa para pessoa. Se isto acontecer, estarão criadas as condições para o início de uma nova pandemia de gripe.

Transmissão inter humana do vírus a(h5n1)

A infecção humana com o vírus A(H5N1) é relativamente rara, e este vírus ainda não adquiriu a capacidade de se transmitir facilmente de pessoa-a-pessoa. Quando adquirir esta capacidade preencherá os critérios epidemiológicos necessários para ser considerada uma estirpe pandémica.

Apesar de se terem verificado alguns casos esporádicos de transmissão inter-humana do vírus A(H5N1) China, Tailândia e Vietname só perante uma cadeia de transmissão eficaz e sustentada, com surtos comunitários em larga escala, se pode inferir da existência de um vírus pandémico.

Embora os investigadores ainda não tenham conseguido comprovar, inequivocamente, a transmissibilidade inter-humana do vírus A(H5N1), as alterações que já ocorreram no padrão da doença devida à infecção humana com o vírus da gripe das aves permitem pressupor essa transmissão.

Dificuldade na erradicação da gripe em aves de capoeira

Para a prevenção da gripe pandémica é crucial que se impeça a infecção das aves domésticas com o vírus A(H5N1). Contudo, as estratégias implementadas a nível regional e local têm sido pouco eficazes, pelas seguintes razões:

Assim, podem decorrer muitos anos até que seja possível eliminar na Ásia o vírus A(H5N1) se algum dia tal for possível! Entretanto, manter-se-á a possibilidade do vírus poder sofrer mutações e recombinações, e transformar-se num vírus pandémico.

1 2

3.  Como proteger a população

A melhor protecção contra os vírus da gripe comum e da gripe das aves é ter boas defesas orgânicas. Isto consegue-se através de uma dieta alimentar equilibrada, exercício regular, descanso adequado, redução do stress, não fumando e evitando locais públicos com grande concentração de pessoas e sem boa ventilação natural.

Também existem algumas medidas básicas de higiene individual e colectiva higiene pessoal e ambiental que devem ser tomadas para reduzir o risco de infecção, como por exemplo, lavar frequentemente as mãos com sabão líquido (para reduzir o risco de transmissão de pessoa a pessoa), sobretudo antes das refeições, após a utilização de sanitários e depois de tocar no nariz, na boca e nos olhos. Durante os acessos de tosse e espirros, a boca e o nariz devem ser protegidos com lenços descartáveis de papel, depositando-se estes de modo adequado em recipientes de lixo com tampa e, de seguida, lavando-se bem as mãos (com sabão líquido e água corrente).

Vacinas

As vacinas actualmente disponíveis no mercado não protegem as pessoas contra a gripe das aves infecção com o vírus A(H5N1) embora já existam protótipos de vacina em diferentes fases de teste e produção. Contudo, na fase inicial de uma pandemia de gripe, e no período que antecede o seu início, é pouco provável que existam vacinas com a eficácia desejável, as quais têm que ser específicas para o vírus pandémico que circular. Por outro lado, a produção de vacinas pode demorar vários meses. Dependendo da altura em que surgir a segunda onda da pandemia, os cientistas podem já ter desenvolvido uma vacina específica, segura e eficaz.

Fármacos antivíricos

Existem duas categorias de medicamentos antivirais que podem diminuir a duração e a gravidade da doença os inibidores M2 (amantadina e rimantadina) e os inibidores da neuraminidase (oseltamivir e zanimivir). Porém, ainda não há consenso científico sobre a sua utilização em larga escala, durante uma pandemia, sendo impossível determinar a sua eficácia até o vírus pandémico entrar em circulação. Em Portugal, o Ministério da Saúde já garantiu a disponibilização atempada de oseltamivir, que parece ser o medicamento mais eficaz. Contudo, este antiviral deverá ser utilizado criteriosamente, e a sua prescrição deve ter como principal objectivo a redução do número óbitos e de casos de doença, principalmente dos casos graves, e a prevenção de casos de infecção (quimioprofilaxia) nos profissionais "operacionais" com maior risco de exposição ao vírus.

Os antivirais devem ser administrados desde o início da doença. A aspirina nunca deve ser prescrita a crianças e adolescentes até aos 18 anos de idade, pelo risco de indução do Síndrome de Reye. A utilização de anti-virais durante uma pandemia é descrito com mais detalhe no capítulo "controlo da pandemia de gripe".


 

[1] Fonte: Organisation Mondiale de la Santé Animale. Office Internacionale des Épizooties. Update on avian influenza in animals 2005-11-22

http://www.oie.int/downld/AVIAN%20INFLUENZA/A_AI-Asia.htm

[2] Fonte: WHO. Avian influenza (“bird flu”) and the significance of its transmission to humans: clinical course and treatment of human cases of H5N1 avian influenza,

http://www.who.int/mediacentre/factsheets/avian_influenza/en/

[3] Até 30 de Dezembro de 2005.

Fernando Costa Silva © Portal de Saúde Pública, 2006