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Avaliação Económica em Saúde

A.  Introdução

B.  Avaliação Económica em Saúde

C.  QALYS - Quality Adjusted Life Years

D.  Tipos de Avaliação Económica em Saúde

E.  Conclusão

F.  Bibliografia

Introdução

O interesse dos aspectos económicos na Saúde reflecte-se no grande aumento do número de publicações de estudos económicos, nos últimos anos. Warner e Hutton em 1980 já alertavam para este aspecto, comparando a dúzia de publicações em 1968 com as mais de 100 em 1978.

A informação sobre os custos e os benefícios na saúde é incerta e incompleta mas uma abordagem estruturada dá-nos um enquadramento útil para organizar informação diferenciada e para ajudar os decisores na definição de políticas concretas. A avaliação económica é um processo que leva os agentes a definir as opções de modo explícito.

A avaliação económica é a análise comparativa de actividades alternativas em termos dos seus custos e de suas consequências (Drummond et al., 1997).

É apropriada quando os recursos são limitados, existe mais de uma alternativa e pretende-se maximizar o benefício por unidade de custo; é importante realçar que ela informa sobre as decisões, mas não é prescritiva.

O princípio da optimização conduz grande parte do esforço da avaliação económica, seja através da maximização do produto de saúde para um dado orçamento, seja pela minimização dos custos para um dado resultado. Este princípio baseia-se na ideia que as mudanças estruturais adequadas podem conduzir a melhorias dos serviços de saúde a menores custos; é válido mesmo quando os diferentes sistemas de saúde têm estruturas básicas diferentes e têm métodos diferentes de calcular custos.

Estas avaliações podem ser um instrumento útil para a tomada de decisão na afectação de recursos de cuidados de saúde quando combinadas com a utilização do saber clínico, com a comunicação dos pacientes e com o reconhecimento da heterogeneidade das instituições e das doenças. Por fim, quando, se pretende analisar os custos dos cuidados de saúde, o primeiro passo consiste em definir o contexto no qual o estudo será efectuado e os elementos que farão parte da análise.

 

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Avaliação Económica em Saúde

Geralmente são descritos na literatura quatro tipos de avaliação económica em cuidados de saúde (Drummond et al., 1997): análise de custo-minimização (CMA); análise de custo-efectividade (CEA); análise de custo-utilidade (CUA) e a análise de custo-beneficio (CBA). As diferenças chave encontram-se na forma como as consequências são medidas e avaliadas.

Componentes da Avaliação Económica

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O primeiro passo da análise consiste na identificação dos custos e a sua quantificação em unidades monetárias.

Os custos são tratados da mesma forma nos quatro tipos de avaliação económica, mas diferem na forma de tratar os benefícios/ consequências. Pode-se pensar em passos comuns para a sua determinação: especificar os recursos usados, contabilizar as unidades de cada recurso, atribuir valores a esses custos, que se aproximem do seu custo de oportunidade ou ajustar para diferentes horizontes temporais. É importante ter em consideração que na avaliação económica o valor para a sociedade, medido por exemplo, pelo rácio benefício-custo, pode ser elevado, mas não o ser para todos os membros da sociedade. Por exemplo, num programa que leve a menor utilização de um prestador, este fará uma avaliação negativa do programa.

A produção no sector da saúde funciona em duas etapas: há recursos usados a produzir terapias, que depois são usadas pelo doente para produzir saúde; por outro lado, as terapias são normalmente compostas por elementos, que são resultado de utilizações de recursos. Por exemplo: uma terapia pode envolver o recurso a medicamentos e a testes laboratoriais; produzir medicamentos e testes utiliza também recursos, embora a produção da terapia não os utilize directamente.

É importante saber que custo é diferente de preço ou de pagamento directo; enquanto que o custo está associado aos recursos consumidos, preço é o que o utilizador paga. Geralmente deve-se conhecer preços e quantidades.

Os custos são os valores dos recursos associados a um determinado produto. As despesas não são necessariamente um custo. O custo-eficácia é o custo líquido por produto de saúde. Os decisores podem utilizar diferentes orçamentos para focar custos segundo perspectivas particulares, mas existem uns certos números de princípios para estimar os custos em que os economistas da saúde concordam.

Os custos directos (i.e. aqueles para os quais os pagamentos são feitos) são os recursos gastos e pagos na execução do diagnóstico, prevenção e tratamento; envolvem uma transferência monetária. Podem ser identificados através da actividade dos hospitais e das clínicas, dos serviços médicos, medicamentos e exames auxiliares.

Os custos indirectos são recursos perdidos devido à doença ou à intervenção para prevenir ou tratar a doença (por exemplo, tempo perdido)não envolvem uma transferência monetária. Estes incluem os custos de morbilidade (o valor ou a perda de produtividade; são estimados como o resultado dos ganhos que um indivíduo teria obtido se não fosse afectado pela enfermidade ou o número de dias perdidos pela população activa) e de mortalidade (o resultado do número de mortes gerado pela doença e o valor esperado dos ganhos futuros do indivíduo de acordo com a sua idade).

Os custos variáveis variam com o volume de produção (altera-se com a escala de actividade)ao contrário dos custos fixos que não dependem da quantidade (não se altera com a escala de actividade). Os custos padrão podem-se tornar obsoletos se a prática clínica é alterada frequentemente.

Custo médio é o custo por unidade produzida. Os custos intangíveis estão associados a efeitos cuja valorização é difícil (por exemplo, dor ou infertilidade). Custo marginal é o custo incremental associado com a última unidade produzida. O preço nem sempre é a abordagem adequada para o custo de oportunidade dos recursos. O custo de oportunidade mede o custo numa perspectiva de utilização alternativa dos recursos. O valor também depende da perspectiva temporal; alguns recursos podem ter um pequeno custo de oportunidade no curto prazo e um custo elevado no longo prazo. Porque os custos e os benefícios podem-se estender a prazos dilatados, comparações ingénuas de custos por doente podem levar a conclusões erradas. A actualização e o desconto são conceitos baseados na preferência temporal que permite definir os valores no presente e no futuro. Geralmente, a sociedade prefere adiar custos e antecipar benefícios...

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Os custos baseados na prevalência estimam os encargos ocorridos durante um período específico, independente do tempo de doença. Os custos baseados na incidência estimam os custos na vida associados à doença e a morbilidade.

A análise dos custos está dependente da qualidade dos dados disponíveis.

Os estudos de custos podem ser efectuados a diferentes níveis de análise e com diferentes perspectivas analíticas. Os sistemas de apoio à decisão e sua subsequente análise de custo têm que agregar actividades associadas a tratamentos e custos associados para cada nível de análise (i.e. doentes e grupos de doentes, procedimentos para doenças, componentes de cuidados de saúde, etc.).

As distorções na análise dos custos podem ser introduzidas de várias maneiras se o analista não formular explicitamente a perspectiva particular do interesse do decisor: sociedade, comprador, segurador, paciente, patrocinador, investigador.

Os custos médicos podem ser avaliados por parâmetros de saúde não monetários como anos-vida ajustados pela qualidade (QALY), anos-vida ajustados pela incapacidade (DALY) em oposição aos ganhos ou perdas monetárias. A utilidade da vida é o valor atribuído ao número de anos de vida com a doença e a qualidade de vida em cada ano. Os benefícios em unidades físicas, tais como anos de vida ganhos, foram melhorados pelo cálculo do custo por QALY acrescido, uma medida compreensiva e padronizada do estatuto da saúde que tem muitas vantagens para o decisor dos cuidados de saúde. Todavia existem muitos problemas e limitações dos métodos existentes e medidas subjacentes que foram concebidas para exprimir o produto da saúde e para comparar intervenções e programas.

Como já se disse, a valorização da vida é um aspecto importante da análise de custos. O problema da eficiência exige uma definição cuidada do resultado ou do produto dos cuidados de saúde. Para determinar o custo efectivo do tratamento, é necessário decidir o preço por ano-vida ganho que a sociedade está disposta a pagar. Os economistas em geral adoptam duas abordagens: na abordagem do capital humano um indivíduo é encarado como produzindo um fluxo de produto que é valorizado em termos de mercado e o valor da vida é descontado no fluxo dos ganhos. Porque a vida é valorizada nestes termos, a técnica atribui valores muito reduzidos a crianças e reformados. A dor e outros intangíveis (como o sofrimento) são omitidos desta abordagem. A abordagem disposição a pagar (WTP) valoriza a vida segundo o que os indivíduos estão dispostos a pagar para uma mudança que reduza a probabilidade de doença ou da morte. A riqueza dos indivíduos envolvidos influencia a valorização da vida mas inclui, ao contrário da abordagem pelo capital humano, o fardo da dor e do sofrimento.

O cálculo do QALY incorpora as preferências do paciente para obter estas ponderações (níveis de qualidade) para os diferentes estados de saúde. O peso da preferência individual para um resultado particular é a utilidade. O método convencional para medir as utilidades é o de Neumann-Morgenstern no qual o paciente escolhe entre certos estados de saúde relevantes e um jogo alternativo em que os resultados possíveis sejam melhores ou piores. Um método alternativo, uma técnica de escolha inter-temporal é também um método de escolha forçada no qual o paciente tem que equacionar o valor da vida entre dois estados de saúde com diferentes tempos de vida.

Há pois que identificar os benefícios. Os benefícios directos são poupanças potenciais por menor utilização de recursos. Em geral, estes benefícios directos, por serem custos evitados, não oferecem grande dificuldade de quantificação. Os benefícios indirectos são efeitos potenciais de produtividade que não seriam alcançáveis de outro modo.

Tipicamente, na estimação de benefícios indirectos há a considerar perdas de salário e de produtividade resultantes da doença; envolve frequentemente a necessidade de valorizar a "vida". Os benefícios intangíveis são benefícios psicológicos decorrentes de melhor saúde. São de muito difícil quantificação.

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QALYs — Quality Adjusted Life Years

A aproximação mais frequentemente usada para fornecer um indicador total do “valor”  ou “utilidade”  para intervenções em cuidados de saúde são os QALYs. Este conceito é uma das contribuições mais importantes da teoria económica para a análise dos benefícios no sector da saúde e tenta ultrapassar as limitações das medidas clínicas.

A suposição básica do QALY é que há dois resultados principais associados com os cuidados de saúde:

(a) expectativa de mortalidade ou de vida, expressa em termos de anos-vida ganhos;

(b) qualidade de vida com saúde, que pode ser transformada numa escala de 0 a 1 e ser usada para “pesar anos-vida”, ponderando cada ano remanescente da vida de uma pessoa pela qualidade de vida esperada no ano em questão (os limites da escala são 1 = saúde “total” e 0 = “estado equivalente à morte”; os estados da saúde vistos como sendo piores do que a morte pode existir e são-lhes dados um valor negativo) “. O valor de um resultado de saúde para um indivíduo é calculado como o produto de dois factores: o aumento na utilidade do estado de saúde da pessoa e o número de anos em que se verifica essa melhoria.

A figura seguinte fornece uma representação esquemática simples do modelo de QALY.

A figura traça dois perfis de estados da saúde sobre o tempo: a linha inteira indica o prognostico para o paciente na hipótese sem tratamento, e a linha tracejada revela o prognostico previsto com o tratamento que está a ser avaliado. Deve ser claro que sob ambos os cenários, o paciente tem uma expectativa de vida de 8 anos; o tratamento em hipótese melhorará a qualidade de vida mas não prolongará o comprimento da vida.

A área preenchida, A, representa o ganho associado com a aplicação do tratamento e a área B indica a perda pelo tratamento nos estágios iniciais, talvez devido aos efeitos secundários sabidos da droga no primeiro ano da administração. O ganho total em QALYs, do tratamento fornecido é então a área A menos a área B (= 3,2 QALYs).

Os QALYs baseiam-se em duas hipóteses que podem levantar objecções: que o valor para a sociedade é igual à soma dos benefícios de saúde que produz; o benefício de saúde em cada indivíduo é a soma dos ganhos em saúde (qualidade de vida) nos anos de vida em que o indivíduo beneficia dos efeitos do serviço de saúde. Só para referência, existe uma alternativa, que são os anos de vida equivalentes (HYE).

Em teoria, os QALYs permitem incorporar todo o tipo de condições e intervenções, através da atribuição de um valor de utilidade aos diferentes estados de saúde.

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Essa utilidade pode ser medida por "standard gamble", "time trade-off" ou por inquirição directa de uma escala.

Para a utilização do "standard gamble" há duas alternativas:

A 1ª alternativa, que tem dois resultados possíveis: Regresso ao estado de saúde perfeita por t anos (com probabilidade p) e morte imediata (com probabilidade 1-p).

A 2ª alternativa é a manutenção de uma determinada condição por t anos.

Coloca-se a questão de qual a probabilidade p que torna o indivíduo indiferente entre estas duas alternativas. Essa probabilidade será o índice de utilidade que se procura.

Para a utilização do "time trade-off" há duas alternativas:

Na 1ª alternativa, o estado de saúde é H por t anos, seguido de morte;

Na 2ª alternativa, consegue-se um estado de saúde perfeita por x anos, seguido de morte. Qual o valor de x que torna as alternativas equivalentes? O rácio x/t será então o score atribuído.

Na inquirição directa da escala, os valores são obtidos perguntando directamente a valorização dos estados de saúde numa escala linear, por exemplo, de 0 a 100, sendo depois convertida para o intervalo [0,1]

Para a utilização dos QALYs não é obrigatório construir os índices de utilidade desde o início. Podem usar-se instrumentos já existentes, como o EuroQoL (EQ-5D).

O EuroQoL é um Sistema com 5 atributos: Mobilidade; Autonomia; Capacidade de desenvolver actividades do dia-a-dia ; Dor, desconforto e­ Ansiedade, depressão.

Cada atributo tem três níveis, dando 243 estados de saúde possíveis, somados ao nível "inconsciente" e ao "morto" (havendo no final 245 estados de saúde a quantificar). A quantificação é feita com “Time Trade-Off”, recorrendo a 30000 pessoas.

O Sistema trata (Drummond et al., 1997):

Mobilidade: Sem problemas; Dificuldades em andar; Acamado.

Autonomia: Sem problemas; Alguns problemas na higiene pessoal e a vestir; Incapaz de se lavar e vestir.

Actividades dia-a-dia: Sem problemas; Alguns problemas; Incapaz.

Dor, desconforto: Sem dor ou desconforto; Moderado; Extremo.

Ansiedade, depressão: Sem problemas; Moderada; Extrema.

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Tipos de Avaliação Económica em Saúde

Em termos históricos, os tipos de avaliação económica impõem-se de forma diversa :

Evolução histórica da Avaliação Económica em Cuidados de Saúde

 

 

Custos

Medida dos Benefícios

1960’ s

Análise Custo-Beneficio

$

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1970’ s

Análise Custo-Efectividade

$

Unidades Naturais

Exemplo: Anos-vida ganhos

1980’ s

Análise Custo-Utilidade

$

Estado Saúde

Exemplo: QALYs

1990’ s

Análise Custo-Beneficio (novamente)

$

“Willingness-to-pay”

De uma forma mais pormenorizada, falemos dos tipos de avaliação económica.

1. Análise de Minimização de Custos (CMA). É a mais comum na literatura. Mede os custos das várias alternativas em unidades monetárias. As consequências das várias alternativas são supostas e idênticas, qualquer que seja a alternativa escolhida. Dada a hipótese anterior não necessita de quantificação das consequências. Considera somente artigos com custos explícitos em unidade monetária. Representa uma forma parcial de avaliação económica, excepto nos casos em que as consequências são equivalentes. Não permite a avaliação do valor absoluto de uma alternativa. O resultado é custo total ou líquido e expressa-se em unidades monetárias. Por exemplo, avaliação de dois medicamentos equivalentes em que o efeito se provou ser igual, embora os custos de aquisição e de administração dos dois medicamentos possam ser bastante diferentes.

2. Análise Custo-Efectividade (CEA). É o segundo o mais comum. Caracteriza-se por ter um único efeito de interesse. O efeito é comum a todas as alternativas consideradas. Cada alternativa permite alcançar o efeito desejado com diferentes intensidades. Os custos são medidos em unidades monetárias. As consequências são medidas em unidades naturais. A eficácia está em unidades clinicamente relevantes. Unidades típicas são: anos de vida ganhos; baixa de 1% nas LDL; dias de incapacidade evitados; redução da tensão arterial. Não há uma comparação implícita entre custos e benefícios nem uma valorização das consequências. Implicitamente, admite-se que vale sempre a pena obter os efeitos que resultam das alternativas consideradas. A comparação entre as várias alternativas não é perfeita. A comparação final é deixada ao critério do decisor; será a avaliação implícita de cada decisor que comparará a importância relativa das diferentes consequências e dos custos de cada alternativa.

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3. Análise Custo-Utilidade (CUA). É um exemplo especial de CEA onde as consequências são medidas como QALYs ganhos. Em termos de consequências das diversas alternativas consideradas, podem ser unidimensionais ou multidimensionais. Não são necessariamente comuns a ambas as alternativas. As consequências são medidas em unidades físicas, como anos vida ajustados para a qualidade, ou anos de vida ajustados para a incapacidade; as consequências são ajustadas por pesos atribuídos aos diferentes estados de saúde. Ou seja, os estados de saúde associados com os resultados são valorizados uns relativamente aos outros. Isto significa que se pode valorizar a qualidade dos anos de vida ganhos, e não apenas o mero valor dos anos. Esta abordagem é especialmente útil para os tratamentos ou programas que prolongam a vida à custa de efeitos secundários ou tratamentos que levem a reduções de morbilidade e não de mortalidade. A análise custo-utilidade é mais geral que a análise custo-efectividade. A diferença está em tornar clara a comparação entre consequências.

Torrance et al. (1973) e Bush et al. (1973) estimaram estas avaliações relativas de estados da saúde (“ utilidades “) empiricamente referindo-se aos médicos ou aos pacientes. Uma forma de perceber isto está na pergunta “quantos anos de dialise você trocaria por um transplante?”; outra é obter um ranking linear de estados da saúde apresentando ao indivíduo uma escolha entre uma certeza de ter um estado da saúde e o risco (“gamble”) de estar pior ou melhor. As avaliações relativas dos estados são obtidas por duas aproximações, conhecidas como Método “time trade-off” e “standard gamble” (Berg 1973; Culyer 1978). A medida das consequências da “utilidades em saúde” é um componente essencial da variante da análise do custo-efectividade conhecida como análise custo-utilidade. Esta aproximação tem popularidade porque tem uma aplicação mais vasta do que a análise simples da eficácia de custo, contudo evita a introdução controversa de benefícios de medição em termos do dinheiro. Um exemplo de um estudo que usa esta aproximação é o de Stason e Weinstein (1977); a sua finalidade era aplicar a análise custo-efectividade à monitorização da hipertensão essencial, para determinar como os recursos podem ser usados o mais eficientemente possível num programa para tratar a hipertensão e para comparar com usos alternativos relacionados com a saúde, destes recursos. A medida central de benefício está no facto de que, embora a selecção e o controle da pressão do sangue possam prolongar a vida, a medicação também tem determinados efeitos colaterais indesejáveis. Mas o prolongamento da vida não é o único benefício potencial da baixa da pressão arterial, uma vez que os Acidentes Vasculares Cerebrais e os Enfartes do Miocárdio também podem ser evitados; consequentemente, uma análise foi feita e os resultados foram expressos em QALYs. De facto, a análise da sensibilidade era uma característica central deste estudo particular, dados os custos das incertezas sobre a concordância paciente com terapia, tratamento médico, e a avaliação de efeitos colaterais adversos e subjectivos da medicação. Variações num número destes factores foram encontradas como tendo um impacto substancial na relação custo-efectividade. Não obstante, o estudo foi útil para fornecer informações úteis sobre a eficácia de diferentes formas de controlar a hipertensão. Saber se o tratamento da hipertensão representa um uso eficiente de recursos da saúde só foi conseguido indirectamente pela análise. O custo por QALY foi de US $10 500 para pacientes com pressões diastólicas acima de 105 mmHg e US $20 400 para pacientes com pressões diastólicas entre 95 e 104 mmHg. Se isto é ou não um preço razoável a pagar depende da avaliação subjectiva que cada um dá à vida. Outros exemplos de análises custo-utilidade incluem os estudos de Boyle et al. (1983) em Cuidados Intensivos Neonatais, o de Torrance Zipursky (1984) na Imunização anti-D, e no de Williams (1985) no Bypass Coronário.

4. Análise Custo-Benefício (CBA). Mede os custos e benefícios em unidades monetárias. Tal como a análise custo-utilidade, trata consequências uni ou multidimensionais. As consequências não precisam ser comuns às várias alternativas e são quantificadas em unidades monetárias; como tal as consequências, ou benefícios, são directamente comparáveis com os custos. Todos os custos e benefícios devem ser incluídos. A maior dificuldade está nos benefícios. Frequentemente são difíceis de medir, de quantificar em unidades monetárias, ou ambas as coisas simultaneamente. Exemplos de benefícios de difícil quantificação: maior qualidade de vida para o doente; Maior satisfação do doente com o sistema de saúde; melhores condições de trabalho para o profissional de saúde. A grande diferença desta forma de análise é precisamente o de medir custos e benefícios nas mesmas unidades, por forma a que sejam comparáveis. É a única forma de que permite comparar benefícios obtidos com custos. Neste sentido, é a forma “mais geral” de avaliação económica. Sendo-o, porque não é a única a ser usada? Porque tem um problema essencial: existem grandes dificuldades em medir, na mesma unidade dos custos, nomeadamente unidades monetárias, as diferentes formas de benefício. Além disso, eticamente, é um desafio: qual o preço da vida?

Uma doença com elevados custos de acompanhamento é o Síndroma de Imunodeficiência Adquirida (SIDA). Para travar a difusão desta doença, têm aparecido várias propostas de medidas e programas. Uma das medidas mais controversas é a de tornar obrigatória a realização de um teste pelos dois elementos de um casal, ntes de casar. McKay e Phillips (1991) realizaram uma análise custo-beneficio desta proposta. Quantificar o custo é fácil, pois basta somar o aconselhamento ao casal com o custo por teste. Estimaram-se os custos em 25928230 euros, caso o aconselhamento fosse dado aos casais HIV positivos, e 129.000.000 euros, se fosse dado a todos os casais. Os benefícios seriam os custos poupados por serem evitados casos de SIDA, com o teste. Aqui foi mais difícil fazer a estimativa, pois varia com a taxa à qual o SIDA é transmitida através das relações sexuais do casal, a percentagem de casais que têm relações sexuais antes do casamento, a forma como os seus comportamentos são alterados por o teste ser positivo para um deles e o valor da vida humana poupada. De todas as combinações, surgiu o rácio beneficio-custo em 32 cenários diferentes, concluindo que em 30 destes o rácio é superior à utilidade. Segundo os autores, esta é a evidência a favor de tornar o Teste do HIV obrigatório. Mesmo não contando com custos não contabilizados, como um teste falso positivo!

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Os resultados de CEA e de CUA são expressos tipicamente como uma relação incremental do custo-efectividade (ICER), por meio da qual a diferença entre alternativas nos custos é dividida pelas diferenças na efectividade (ou no QALYs).

Uma vez que na CBA todos os custos e consequências são expresso em termos monetários, o resultado pode simplesmente ser expresso enquanto uma expressão líquida do benefício definida como o valor dos benefícios menos o valor dos custos.

No tocante ao uso das várias formas de avaliação económica, colocam-se questões gerais do tipo, "quanto se deve gastar para tratar um doente renal?". Neste tipo de questão é mais adequada a análise custo-benefício ou a análise custo-utilidade. Em questões mais específicas, do tipo "deve-se usar hemodiálise ou outra alternativa?", é mais adequada a análise custo-efectividade.

A questão fundamental na leitura de um estudo de avaliação económica é: "São os resultados úteis para a decisão?". Para responder a esta questão têm sido propostas várias baterias de perguntas. Não se espera que um estudo responda adequadamente a todas as questões, mas apenas que a sua aplicação permita apreciar as vantagens e desvantagens do estudo. Uma delas é a seguinte:

Foi definida uma questão clara? (Saber se o estudo avaliou custos e efeitos, procedeu a comparação de alternativas e qual foi o ponto de vista utilizado)

Foi realizada uma descrição exaustiva das alternativas? (Saber se é possível saber quem faz o quê a quem, quando e como, se foram omitidas alternativas relevantes e se deve ser considerada uma alternativa artificial "fazer nada ")

Foi apresentada evidência da efectividade dos programas ou serviços? (Saber se essa evidência se baseou em ensaios clínicos, se­ foi estabelecida com base numa recensão de estudos clínicos, que hipóteses foram utilizadas para estabelecer a efectividade e que tipo de viés são susceptíveis de introduzir)

Foram correctamente identificados os custos e consequências de cada alternativa relevante? (Saber se foi usado o detalhe suficiente e se as categorias de custos e benefícios identificadas permitem a utilização de vários pontos de vista)

Os custos e consequências foram medidos de forma apropriada em unidades físicas? (Saber se houve elementos omitidos, se são relevantes para a análise, se houve casos em que a medição foi especialmente difícil, como foi resolvido o problema)

Os custos e benefícios foram avaliados de forma adequada? (Saber se são as fontes de todos os valores claramente identificadas, se possíveis fontes são valores de mercado, preferências dos doentes ou dos médicos, visão dos profissionais, se foram usados valores de mercado, e se esses valores de mercado aproximam os verdadeiros valores)

Os custos e consequências foram ajustados para diferentes horizontes temporais? (Saber se foram os custos e consequências que ocorrem no futuro descontados para valores correntes e se foi dada alguma justificação para a taxa de desconto intertemporal utilizada)

Foi realizada uma análise incremental dos custos e das consequências das alternativas em apreciação? (Isto é, saber se foram os benefícios adicionais de uma alternativa face à outra comparada com os custos adicionais dessa alternativa por comparação com a outra.)

Considerou-se a existência de incerteza nas estimativas dos custos e consequências? (Saber se o estudo procedeu a uma análise de sensibilidade face aos valores estimados, se foi justificada a amplitude de valores para a análise de sensibilidade e se os resultados do estudo alteraram-se com essas variações nos valores dos parâmetros)

A apresentação e discussão dos resultados incluíram todas as questões relevantes para os utilizadores do estudo? (Saber se as conclusões se basearam na análise de um indicador global, se foram retiradas de forma mecânica, se foram as conclusões comparadas com as de outros estudos que tenham tratado do mesmo problema, se foram referidas diferenças de metodologia, se o estudo discutiu possível generalização dos resultados a outros contextos ou grupos, se o estudo discutiu factores importantes que poderiam alterar as conclusões - por exemplo, considerações distributivas - e se o estudo discutiu questões de aplicação das alternativas, como limitações de ordem financeira ou libertação de recursos susceptíveis de outras aplicações)

A preocupação com a utilização dos estudos de avaliação económica levou, em vários países, à criação de orientações metodológicas. Além destas existem diversos tipos de orientações, com diferentes objectivos: as orientações para estabelecimento de preços e regras de reembolso, as orientações para aprovação e as orientações para promoção.

As orientações metodológicas, que têm como objectivo estabelecer um consenso entre investigadores para criarem e realizarem de forma apropriada estudos de avaliação económica, reportando resultados económicos e humanísticos comparáveis entre estudos. O Despacho 19064/99 apresenta “Orientações metodológicas para avaliação de medicamentos”. De acordo com as orientações metodológicas deste despacho consegue-se uma demonstração das vantagens económicas de novos medicamentos face às alternativas terapêuticas existentes.

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Conclusão

O quadro tenta resumir os elementos chave dos principais tipos de análise de custo.

Principais avaliações económicas dos cuidados de saúde: métodos de análise

 

Minimização do custo

(CMA)

Custo-beneficio

(CBA)

Custo-utilidade

(CUA)

Custo-eficácia

(CEA)

Definições

Identifica o custo incorrido

Mede o custo e o resultado na mesma unidade monetária

Compara as opções de produto em termos das preferências individuais ou sociais

Compara as opções em termos do seu custo por unidade de produto de saúde

Pressupostos

 

A análise de sensibilidade mostra como estes pressupostos afectam os resultados.

Os produtos de saúde são valores esperados.

Recursos escassos e limitados de cuidados e saúde implicam opções de afectação.  As escolhas maximizam benefícios dos cuidados de saúde entre a população mais do que a distribuição equitativa desses benefícios.

Resultados

Intervenção ou programa menos dispendioso

Ganhos líquidos = beneficio menos custo; rácio custo / beneficio

O produto mede uma “equivalência” (i.e. utilidade) aplicável a qualquer área medica (QALY ou  DALY).

Estabelece um patamar de custos aceitáveis por unidade de eficácia

Eficácia

Raramente adequada a situações clínicas

Compara diferentes estratégias com diferentes resultados.

Optimização dos benefícios líquidos; i.e. maximização dos efeitos para um determinado orçamento ou minimização do custo por opção de produção de saúde.

Características

Exclui qualquer descrição dos resultados

Custo e produto são valorizados em unidades monetárias

Quantifica os benefícios em unidades naturais de produto tais como sobrevivência ou funções alteradas.

Os custos médicos são avaliados em face de parâmetros de saúde. Estes dependem da valorização da vida baseada no capital humano ou na disponibilidade a pagar.

Problemas

Ignora o custo de oportunidade dos recursos utilizados.

Difícil de exprimir o montante preciso dos benefícios em termos monetários.

Os ajustamentos dos efeitos qualidade i.e. QALY são arbitrários.

As escolhas clínicas podem implicar resultados diferentes (e.g. mudanças no estatuto funcional, esperança de vida e qualidade de vida).

Falta de fundamentação formal em princípios económicos.

Termino com um exemplo prático dos diferentes tipos de avaliação económica, em saúde, adaptado de «Pharmacoepidemiology notes. Economic evaluation of pharmaceuticals».

A

$20000

4.5 anos

.80

3.6 QALYS

$4000

B

$10000

3.5 anos

.90

3.15 QALYS

$2000

Análise Custo-Minimização

Identifica o custo mais baixo de várias alternativas, assumindo benefícios iguais

No exemplo é o Tratamento B

Análise Custo-Efectividade

Calcula o custo por unidade do efeito (resultado clínico)

A: 20000/4.5 = 4444 / ano de vida ganho

B: 10000/3.5 = 2857 / ano de vida ganho

Ratio (A vs. B) custo-efectividade: (20000 – 10000) / (4.5 – 3.5) = $ 10000 / ano

Análise Custo-Utilidade

Peso do beneficio clinico por valor de utilidade

A: (4.5) / (.8) = 3.6 QALYs

B: (3.5) / (.9) = 3.15 QALYs

Ratio (A vs. B) custo-utilidade: 10000 / .45 = $ 22222 / extra QALY

Análise Custo-Benefício

Dá um valor monetário aos resultados

No exemplo: valor de vida extra em A é de $ 4000; em B é de $ 2000

Ratio (A vs. B) custo-benefício: (20000 – 10000) / (4000 – 2000) = 5

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Bibliografia

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Mário Morais Freitas © Portal de Saúde Pública, 2005